quinta-feira, 19 de março de 2009

A JUSTIÇA NA CONCEPÇÃO RELIGIOSA

Na Bíblia, justiça é apresentada com vários significados. No Antigo Testamento pode designar preposições legais do Pentateuco como sinal da fidelidade à aliança de Deus, ou ainda como costumes morais. Pode ser entendida ainda como a ordem justa da sociedade, cuja prática é uma obrigação moral. A justiça obriga a preocupar-se com os pequeninos, os pobres, as viúvas e os órfãos.
No Novo Testamento, é a justiça divina que serve de fundamento para julgar todas as concepções humanas de justiça. Nos sinóticos, está na base das relações humanas apresentadas no Sermão da Montanha, segundo o princípio “sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito”. Para a teologia paulina, o homem não pode atingir a justiça por seus próprios esforços, mesmo por obediência a lei. A justificação vem pela fé em Cristo através da graça de Deus.
Para Santo Agostinho, não pode haver justiça se não se reconhece o verdadeiro Deus e se toda a vida não se ordena em função dele. Não há uma verdadeira idéia de justiça fora da revelação de Deus em Cristo. O Cristão deve inserir-se nas sociedades terrestres, reconhecendo que elas podem atingir uma espécie de justiça, porém, deve reconhecer também seu caráter imperfeito e transitório.
Tomás de Aquino, contrário a Agostinho, pensa que pode haver uma justiça mesmo entre os não-cristãos. Para ele, a justiça é a virtude específica da vontade. Distingue justiça cumutativa de justiça distributiva. Sendo esta última constituída pelas regras segundo as quais a sociedade distribui as recompensas e castigos e impõe obrigações a seus membros. A primeira, por sua vez, refere-se às regras que governam as relações entre os indivíduos. Por exemplo, a proibição do homicídio.
Também Tomás, assim como Aristóteles, faz relação entre justiça e equidade. Segundo ele, não há nenhuma regra moral que possa ser aplicada com toda certeza em todas as situações possíveis.
Bernhard Haering, em sua obra Livres e fieis em Cristo diz que Deus revela sua justiça revelando o seu amor. A Justiça de Yahweh é quase um sinônimo de sua salvação. É a manifestação de sua salvação, de sua bondade e de sua misericórdia.
Diante desta justiça, resta-nos o compromisso de agir sempre usando a mesma justiça e misericórdia. Aceitar o Reino de Deus significa aceitar a justiça salvífica de Deus. O cristão deve reconhecer que a justiça de Deus deve ser concreta entre os homens, o que inclui, sobretudo, o amor aos irmãos, amor que não pode ser imposto por conceitos da justiça humana. A vida segundo a justiça de Deus reflete-se de maneira particular na justiça social.
No discurso da Igreja a respeito da justiça, sobretudo na América Latina, quase sempre é mencionada a questão da justiça social. Esta pertence aos conteúdos essenciais do Evangelho. O homem que de fato o recebe, quer vivê-la. Para os valores evangélicos, o amor não pode ser anunciado sem promover a paz e a justiça.
Todo esforço que se fizer para realizá-la na sociedade humana inclui-se na libertação integral de Cristo que aperfeiçoa e supera o trabalho humano dando-lhe sentido integral e absoluto.[1]
Maior ênfase teve este tema na Teologia da Libertação, que afirma o amor de Deus pelos excluídos da sociedade e deseja a sua libertação. A partir deste princípio, elaborou-se um rico discurso de incentivo aos movimentos que trabalham para o desenvolvimento de uma sociedade com mais justiça.
Concluo esta reflexão citando o Catecismo da Igreja Católica, no qual encontramos o conceito de justiça como “a virtude moral que consiste na vontade constante e firme de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido(...), dispõe a respeito de cada um e a estabelecer nas relações humanas a harmonia que promove a equidade em prol das pessoas e do bem comum”.[2] Ou ainda, “o respeito a dignidade humana exige a prática(...) da virtude da justiça para preservar os direitos do próximo e lhe dar o que lhe é devido(...)”.[3]
1. Cf. HAERING, Bernhard. Livres e fieis em Cristo: teologia moral para sacerdotes e leigos. Vol II. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 451-453
2. Catecismo da Igreja Católica n.1807
3. idem n. 2407

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